Greve no Transporte Público fere os princípios da Administração Pública

Que o direito de greve é um direito social garantido constitucionalmente, não se discute. Trata-se de um instrumento necessário para melhorar as relações de trabalho evitando possíveis abusos por parte dos empregadores, sejam eles particulares ou públicos.No entanto, até onde o exercício deste direito não fere um dos principais princípios da administração pública, qual seja, o da continuidade dos serviços públicos?

Até que momento podemos falar que há supremacia do interesse público quando uma determinada classe paralisa os serviços públicos para toda uma população? Os serviços públicos não podem ser paralisados, nem mesmo em momentos de greve. Assim ficou decidido por diversas vezes em sentenças de vários Tribunais, pois o seu atraso ou mesmo “desconfortos” decorrentes deste ferem a sociedade de uma maneira irreparável. Então, será que não está ocorrendo um possível abuso deste direito? O direito de greve é necessário, como citado acima, mas deve-se refletir de se é um direito, deve este ser exercido dentro de parâmetros legais, sem causar prejuízos à sociedade ou desrespeitar outros direitos também constitucionalmente previstos, como vem ocorrendo. O princípio da continuidade dos serviços públicos traz a ideia de que sendo estes indispensáveis ao bom andamento da sociedade a sua falta pode ocasionar sérios prejuízos, até mesmo irreversíveis e para evitar tal descontrole devem ser prestados continuamente dados a sua importância e a sua essencialidade para toda a população. A continuidade dos serviços públicos está intimamente ligada ao princípio da eficiência, hoje expressamente mencionado no art. 37, caput, da Constituição Federal. Logicamente, um dos aspectos da qualidade dos serviços é que não sofram solução de continuidade, prejudicando os usuários. É um dever da Administração Pública não só prestar os serviços públicos, mas disponibilizá-los aos administrados continuadamente, sem interrupções. Serviços Públicos são definidos como “toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob o regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade”. Entendendo-se que serviços essenciais são aqueles que “uma vez ausentes, põe em risco a vida, a saúde e outros direitos fundamentais dos cidadãos, mediante ofensas à ordem pública ou à segurança nacional”. A lei 7783/89, art. 11: “Nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”. Parágrafo único: “São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”. Na lei da greve há uma enumeração dos serviços tidos como essenciais, em seu artigo 10: “tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte público; captação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda; uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo e compensação bancária. E ainda, todos aqueles que se servem dos serviços público são considerados consumidores, e por isso se submetem amas as partes ao Código de Defesa do Consumidor (CDC): “…há que ser dito e reforçado que o usuário de serviço público é consumidor, como previsto, inclusive, na lei consumerista”. O Código de Defesa do Consumidor cita que os serviços prestados pela Administração devem ser eficientes e contínuos, conforme determinação legal, conforme artigo 22: “Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quando essenciais, contínuos. Parágrafo único: Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código. ” Embora a lei proteja os usuários destes serviços, no caso do transporte coletivo, há de se notar que estes usuários são, em sua maioria aqui no Brasil, pessoas com recursos financeiros limitados e, em geral, com baixa escolaridade, segundo estudos estatísticos, que sequer imaginam estar fazendo uso de um Serviço Público delegado e que podem recorrer ao Poder Jurisdicional para vê-lo prestado de forma eficiente. Portanto, não é crível que tais cidadãos vão, efetivamente, exercer tal direito trazido pela lei, não podendo, em face deste dispositivo legal, a Administração deixar o ônus da fiscalização ao administrado. É necessário o Poder Executivo agir de forma responsável na fiscalização das concessões de transporte coletivo, bem como verificar se as condições estabelecidas no contrato estão sendo cumpridas pelo concessionário, decorre de lei, fazendo-se imperioso, portanto, que este tome as medidas cabíveis para a efetiva defesa dos interesses da coletividade, consoante determinam os Princípios da Legalidade e da Supremacia do Interesse Público, que regem a Administração Pública de um modo geral. Assim sendo, os cidadãos possuem o direito à qualidade do transporte coletivo, não devendo se submeter às verdadeiras torturas diárias, causadas pela falta de fiscalização do Executivo Municipal. Devem, sim, exigir do Poder Público o cumprimento do disposto na atual Constituição da República Federativa do Brasil e que tome as medidas necessárias para a efetiva defesa dos interesses dos administrados. Responsabilidade Legal no Transporte Público:

  • aos Municípios: De acordo com a Constituição Federal, o transporte coletivo é um serviço essencial e de responsabilidade dos municípios: art. 30, V: “Compete aos municípios: organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial.”
  • aos Estados: Cabe a regulamentação dos serviços de transporte intermunicipal, de acordo com a Constituição Estadual de São Paulo II – Seção II, art. 158: “Em região metropolitana ou de aglomeração urbana, o planejamento do transporte coletivo de caráter regional será efetuado pelo Estado, em conjunto com os municípios integrantes das respectivas entidades regionais. Parágrafo único: “Caberá ao Estado a operação do transporte coletivo de caráter regional, diretamente ou mediante concessão ou permissão. ”
  • à União: Cabe a regulamentação dos transportes interestaduais e internacionais de passageiros de acordo com o artigo 21 da Constituição Federal: “XII: d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território; e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros. ” e “XX: instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos.”

 Citações em ambitojuridico.com.br e jus.com.br

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